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Armazenagem ganha holofotes na crise
Por Diário do Comércio
28/01/2021
A paralisação das cadeias de suprimentos logo no início da pandemia de Covid-19, entre março e abril do ano passado, jogou luz sobre um elo muito importante na logística que permite que produtos atravessem o mundo e cheguem em qualquer lugar com qualidade: a armazenagem.
Responsáveis não só por guardar, mas, em muitos casos, também por diferentes processos de beneficiamento, os armazéns são capazes de regular a oferta de produtos no mercado. Durante a pandemia, que impediu a circulação de mercadorias várias vezes, com o fechamento de divisas e fronteiras, se tornaram ainda mais importantes.
Nesse novo mundo, em que medidas de isolamento social e fechamento de portos e aeroportos podem se tornar muito mais frequentes, segundo alertam autoridades sanitárias mundiais, investir em tecnologia é parte da solução para manter a atividade sustentável em um país como o Brasil, que além das dimensões continentais, apresenta desigualdades de infraestrutura de igual envergadura.
O Novo Normal da Armazenagem exige digitalização, políticas públicas que entendam a atividade como estratégica para a retomada da economia e integração de todo o setor de logística.
Imprevisibilidade jurídica é grande queixa
A armazenagem é um dos elos da cadeia logística que permite que produtos cheguem ao consumidor final, esteja ele em qualquer lugar do mundo. Responsáveis pela estocagem e, em alguns casos, beneficiamento desses produtos ao longo do caminho, desde a década de 1970 vêm se modernizando. A tecnologia agregada hoje controla desde variações climáticas como temperatura e nível de umidade até o giro dos produtos e monitoramento do transporte da carga que está para chegar e a que já foi despachada.
A crise gerada pela pandemia reforçou a necessidade desses investimentos. Apesar das estradas vazias e portos e aeroportos com capacidade de atendimento reduzida por longos e indefinidos prazos ao redor do mundo, é claro que as pessoas continuam consumindo e os produtos precisavam chegar até elas.
De acordo com o vice-presidente da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística) para o Estado de Minas Gerais e presidente da Federação das Empresas de Transportes de Carga do Estado de Minas Gerais (Fetcemg), Sérgio Pedrosa, é impossível falar de armazenagem sem falar dos transportes.
“Nosso setor não parou. Costumo dizer que no Brasil, se está na mão, veio de caminhão. A greve dos caminhoneiros, em 2018, mostrou isso. Ressalto a importância dos nossos motoristas, superando o medo da pandemia. A tecnologia tem nos ajudado muito no monitoramento da cadeia. As informações em tempo real do produto em trânsito nos ajuda evitando a falta de produto ou excesso de estoque. A pandemia acelerou a implantação das tecnologias”, afirma Pedrosa.
Para o dirigente, um dos maiores problemas a serem enfrentados pelo Brasil no pós-pandemia, no que diz respeito ao setor, é a legislação confusa e burocrática. A insegurança jurídica, segundo ele, já tem afastado investidores e torna a atividade muito mais cara do que deveria ser.
“A insegurança jurídica nos afeta muito. Relacionado à pandemia temos dois novos fatos: o home office – como controlar a carga horária, o que precisa ser fornecido pelas empresas; e a questão se a Covid-19 pode ser considerada uma doença ocupacional ou não. A imprevisibilidade jurídica é uma grande dor de cabeça para as empresas”, pontua o presidente da Fetcemg.
Agronegócio – Segundo o ex-presidente da Companhia de Armazéns e Silos do Estado de Minas Gerais (Casemg) e ex-presidente do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), Célio Gomes Floriani, a armazenagem é uma atividade importantíssima do agronegócio. Saber como, quando e quanto tempo o produto vai permanecer em estoque é decisivo para que o sistema funcione.
“O produtor tem que estar sempre com um olho no mercado e outro na armazenagem, para que o produto seja colocado de forma adequada à disposição do consumidor. São diversos tipos de armazéns e silos em função da natureza do produto. A armazenagem junto com os transportes são as duas atividades mais importantes da logística do agronegócio. Tem um fator diferenciador no caso do Brasil, com o surgimento da safrinha, começamos a colher o ano todo. Temos uma demanda melhor distribuída. Hoje, 35% do total da safra é no segundo semestre. Antes era tudo na primeira metade do ano. Isso diminui a pressão. Antes o Brasil era um importador e hoje é um significativo exportador e isso também diminui a pressão sobre o sistema”, analisa Floriani.
A exportação criou uma demanda diferente sobre a armazenagem. O mercado externo compra antecipado. Após a colheita, a entrega deve ser o mais rápido possível. Nesse caso, a armazenagem é de transbordo, só para fazer a adequação do produto. É uma operação que ocorre em oito dias, em média, uma rotatividade muito alta.
De outro lado, estão os pequenos produtores brasileiros que não têm capacidade financeira para fazer o armazenamento adequado. A solução para esses casos está no cooperativismo. “O Brasil passa por uma migração da produção. Antes a produção se dava nas regiões Sul e Sudeste e hoje deslocou para o Centro-Oeste, Norte e Nordeste, com destaque para o Centro-Oeste. Em 1980, essas regiões tinham 22,3% da produção nacional, agora, 61,4%. A armazenagem teve que caminhar com ela. Nos EUA, a armazenagem é feita na própria fazenda, mas isso não dá para pensar no Brasil. Lá é produção em escala. Aqui no Brasil é por pequenos produtores. Nesse caso surge o grande papel das cooperativas. Elas podem auxiliar o produtor ordenando a entrega do produto ao mercado sem onerar muito os preços e favorecendo a venda no melhor momento. Hoje, as cooperativas participam significativamente do processo de crescimento da armazenagem brasileira”, pontua o ex-presidente da Casemg.
Tecnologia alavanca o segmento
A tecnologia, assim como aconteceu em quase todos os outros setores, também ganhou espaço e apareceu como solução para o setor de armazenagem ao longo da pandemia. Para o especialista em tecnologias voltadas à área de logística e CEO da Pointer by PowerFleet Brasil, Daniel Schnaider, a qualidade do armazenamento é fundamental. A tecnologia é capaz de identificar problemas como em casos de cargas danificadas, provar que os danos não ocorreram no armazém e sim durante o transporte, por exemplo. A Pointer by PowerFleet Brasil é uma multinacional especialista em soluções para gestão de cargas e frotas.
A Internet das Coisas (IoT) pode, nos casos de uma carga ser aberta, por exemplo, assegurar ao gestor de armazenagem, quando foi, onde foi e até quem foi. Com sensores e câmeras inteligentes acoplados nas caixas e contêineres é possível ter em mãos todo o histórico daquele produto.
A contagem de carga manual também pode ser evitada com a tecnologia. É possível saber com precisão quanto e o que tem dentro do local de armazenamento. “A tecnologia, especialmente a IoT, pode prever e evitar acidentes aferindo parâmetros que podem subsidiar o reforço em um treinamento ou até levar a uma demissão por justa causa, se for um caso de repetição de padrões errôneos. A pandemia trouxe uma reflexão que não existia há muito tempo. Acredito no ganho de produtividade no pós-Covid”, afirma Schnaider.
Outros pontos críticos durante a armazenagem são a manipulação e movimentação das cargas. Existem muitos tipos de produtos: aqueles que precisam estar em uma determinada temperatura, os que não podem ter movimentação brusca, ou mesmo os com data de validade. Mas em um galpão de 2 mil metros quadrados, por exemplo, fica muito difícil manipular tudo isso manualmente. Para isso, a IoT pode indicar quando a temperatura de cada caixa não está adequada, apontar se ela sofreu algum tipo de impacto comprometendo sua qualidade, e também, apontar há quanto tempo aquele material está estocado e, claro, onde está organizado.
Para ter certeza para onde foi cada carga é possível rastreá-la do momento em que sai do armazém até o seu destino. Isso é extremamente importante para que tenha controle do estoque. Além disso, qual produto que foi levado até lá, assim não compromete uma viagem inteira.
“A armazenagem tem o papel ordenador da oferta de produtos. O produto não pode ser contaminado, tem que ter uma questão de segurança e sanidade que antes não aparecia tanto. No Brasil, a armazenagem também atua sobre o bem-estar social. Os armazéns foram muito utilizados nas campanhas de combate à fome. Os armazéns da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) praticamente são utilizados para atender programas sociais como merenda escolar, e atender pequenos produtores”, destaca o ex-presidente do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), Célio Gomes Floriani.
Além das questões relativas diretamente ao negócio, as empresas do setor de armazenagem buscam soluções que atendam uma demanda que já despontava antes da pandemia e que se tornou uma das grandes tendências de consumo a partir da retomada da economia global: a sustentabilidade. A responsabilidade ambiental além de trazer economia de insumos, modernização dos processos, evitar desperdícios e poupar o planeta, também colabora para a atração de investimentos. “O uso da internet das coisas trabalha para o equilíbrio socioambiental. A tecnologia que reduz a quantidade de combustível, reduz o desperdício, nos tornamos mais verdes. O futuro da logística é o futuro da tecnologia, mas precisamos ter mais infraestrutura. Aqui pagamos mais de 10 vezes mais o valor de impostos sobre um equipamento eletrônico do que no México. No Brasil ainda tem pouco 4G, é caro fazer homologação de tecnologias. Precisamos de internet rápida em todos os cantos para integrar esse país continental”, pontua o Pointer by PowerFleet Brasil.